sábado, 31 de março de 2012

Artigo Comentado - ed. 03


Título: "A qualitative and quantitative study of the incidence, features and aetiology of near death experiences in cardiac arrest survivors"
Autor: Sam Parnia, D.G. Waller, R. Yeates, P. Fenwick
Periódico: Resuscitation
Ano: 2001

As Experiências de Quase Morte têm convidado a Ciência a repensar os seus conceitos em relação à consciência humana, sobre sua ligação com o cérebro e sobre a possível existência de percepções extrassensoriais, ou mesmo de vida após a vida. Parte das publicações científicas acerca dessa temática são ainda incipientes e devem ser lidas com atenção para que conclusões precipitadas não sejam tiradas. Todavia, estudos multicêntricos, com maior força estatística, estão sendo conduzidos, e é possível que em breve tenhamos algumas definições.

Este artigo é uma publicação da revista "Ressucitation", um periódico médico internacional que publica estudos sobre a etiologia, a patofisiologia, o diagnóstico e o tratamento de doenças agudas. É vinculada à maior editora médica e científica do mundo, a Elsevier.

Nele o Dr. Sam Parnia e seus colaboradores conduziram um estudo piloto prospectivo de 1 ano entrevistando pacientes que sobreviveram a paradas cardiorrespiratórias (PCR) no Southampton General Hospital, com o intuito de averiguar a incidência, a etiologia e as características das memórias relatadas pelos pacientes durante o período em que eles estiveram inconscientes.


Pessoas que passaram por uma Experiência de Quase Morte (EQM) descrevem enxergar túneis de luz, encontro com parentes falecidos, sensação de estar fora do corpo e poder observar a equipe médica atuando em sua ressuscitação, além de uma sensação de enorme paz e ausência de dor. Tudo isso, supostamente, ocorrendo durante o período de inconsciência. Essas experiências são descritas como "mais reais que o real" e causam mudanças significativas na vida dessas pessoas.

São três as principais vertentes para explicar as EQM´s: processos fisiológicos e farmacológicos que acompanham o processo de morte; resposta psicológica frente a ameaça da morte; experiência transcendental (o que inclui a possibilidade de que a consciência sobreviva à morte do corpo físico).

No estudo conduzido pelo Dr. Parnia, os pacientes foram comparados quanto aos níveis sanguíneos de oxigênio, gás carbônico, eletrólitos e quanto ao ritmo cardíaco durante à inconsciência; quanto a drogas utilizadas na ressuscitação, às crenças religiosas e ao medo da morte no período que antecedeu a parada cardiorrespiratória. Todos os paciente tinham mais de 18 anos e pontuaram 10 em 10, num teste de alerta mental no momento da entrevista.

O estudo entrevistou 63 pacientes, dos quais 7 apresentaram memórias do momento de inconsciência e, destes, 4 foram classificados pela escala Greyson como apresentando uma EQM. Esse número foi considerado pequeno demais para a realização de testes estatísticos significativos, portanto os grupos foram comparados quanto à média e o desvio padrão das variáveis.


Ao contrário do que alguns autores propunham, os pacientes que tiveram uma EQM apresentaram pressão parcial de oxigênio arterial superior aos do grupo controle (todos os demais 59 pacientes). Pode ser que esse resultado reflita apenas um viés atribuível ao pequeno número de pacientes do estudo ou, alternativamente, essa maior oxigenação permitiu um melhor funcionamento cerebral nos paciente que tiveram uma EQM. As drogas administradas foram as mesmas para ambos os grupos, e correspondem àquelas utilizadas nos protocolos de ressuscitação cardiopulmonar.

O estudo sugere que as memórias relatadas pelos pacientes ocorreram durante o período de inconsciência, o que é intrigante, uma vez que as alterações neurológicas que se seguem a uma parada cardiorrespiratória (PCR) são tão intensas que os mecanismos de memória e de subjetividade estariam severamente comprometidos. Experiências complexas, como as EQM, não seriam, a princípio, passíveis de serem memorizadas.

Pelos conhecimentos médicos atuais, a atividade elétrica cerebral cessa poucos segundos após uma PCR, o que pode ser demonstrado pelo estudo da eletroencefalografia (EEG). É impressionante que os pacientes relatem memórias tão complexas num momento em que o EEG está isoelétrico. Mais interessante ainda é a existência de estudos relatando que pacientes cegos conseguiram descrever o ambiente da sala de emergência em que se encontravam durante suas EQM´s.

Estudos multicêntricos precisam ser realizados para melhor avaliar a questão.

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